terça-feira, 13 de novembro de 2012

Catalogação de processos do Juízo do Resíduo Eclesiástico (JRE) e do Juízo dos Resíduos e Provedoria das Capelas (JRC)



Projecto: catalogação dos processos de tomada de contas de testamentos do Juízo do Resíduo Eclesiástico (JRE) e do Juízo dos Resíduos e Provedoria das Capelas (JRC)

Objectivo: realização de um instrumento descritivo em formato papel e disponibilização em base de dados das descrições ao nível do processo

Incorporação: meados da década de 50 do século XX

Datas extremas: [séc. XV - c. 1834]

Dimensão do fundo: 305 unidades de instalação (288 caixas e 17 livros).

Total de documentação descrita: 5.545 processos (reunidos em 153 caixas)

Equipa: Fátima Barros (direcção), José Vieira Gomes (coordenação) e Elsa Gonçalves (descrição)

Prazo de intervenção previsto: 2000 – 2016


Catalogação dos processos de tomada de contas de testamentos do Juízo do Resíduo Eclesiástico (JRE) e do Juízo dos Resíduos e Provedoria das Capelas (JRC)


Tomada de conta do testamento de
 Manuel Ferreira da freguesia da 
Ponta de Sol (1829). ARM, JRE, cx. 154, n.º 24.
O Juízo do Resíduo Eclesiástico e o Juízo dos Resíduos e Provedoria das Capelas eram instituições judiciais com origem medieval, tendo as mesmas sido extintas com o Liberalismo.
A sua presença no arquipélago madeirense remonta ao primeiro século de povoamento. D. João II, por provisão de 19 de Maio de 1486, fez mercê a João do Porto, escudeiro do Duque de Beja, do ofício de juiz dos resíduos e provedor de capelas, hospitais, albergarias, gafarias e órfãos da ilha da Madeira (ARM, CMFUN, RG, T. 1.º, f. 24 v.º). Nos primórdios – como se vê – as funções fiscalizadoras de cariz assistencial foram acumuladas num único tipo de organismo.
Com o tempo, foram criadas entidades especializadas para judicialmente entender em cada tipo de assistência. 
A separação física dos processos pertencentes ao juízo do resíduo eclesiástico dos que constituem o juízo dos resíduos e provedoria das capelas só será feita após o estudo institucional que futuramente se realizará aos referidos organismos.
Ao juízo dos resíduos e provedoria das capelas competia fiscalizar o cumprimento dos testamentos e legados pios. Estava incumbido de pedir conta aos testamenteiros e administradores de capelas dos encargos que por testamento ficaram obrigados honrar. Foi no cumprimento destas funções que foram produzidos os processos de tomada de contas de testamentos. Processos estes constituídos sobretudo por testamentos e quitações comprovativas do cumprimento do testamenteiro das obrigações testamentárias a que se achava obrigado.
Pelo facto de o juiz do resíduo eclesiástico e o provedor das capelas mexerem com questões patrimoniais fez com que não raras vezes se verificassem crispações entre as autoridades civis e eclesiásticas.
Estamos em crer que os juízos do resíduo eclesiástico e provedoria das capelas – a par dos juízos orfanológicos (com os inventários obrigatórios) – são os fundos que mais detêm testamentos anteriores ao Liberalismo. É relevante a importância deste género documental para a investigação histórica, visto que os testamentos, entre outra documentação afim, são uma importante fonte de estudo em muitas vertentes. Nomeadamente para a história económica e social, história da família e da demografia histórica (exemplo: colmatam lacunas dos registos paroquiais). Veiculam a compreensão do que era a visão da morte e do além no Antigo Regime, a doutrina, a religiosidade, crenças, devoções, tudo graças ao estudo dos autos testamentários. 
Através destes processos podemos reconstituir a ascendência e descendência do testador. Identificar os seus elementos familiares presentes ou ausentes do agregado doméstico. Ou, por exemplo, se o falecido possuía escravos ou não e quais as tarefas que os últimos desempenhavam. A documentação permite a reconstituição dos agregados domésticos, os ciclos familiares de apoio, possibilitando ainda estudos genealógicos e no âmbito da mobilidade e da emigração. Os testamentos permitem estudar quais os sentimentos e relações familiares que nortearam a última vontade do testador (por exemplo: escolha do testamenteiro, a preocupação em proporcionar conforto material aos seus entes familiares mais próximos, a atenção conferida aos celibatários que toda a vida dependeram financeiramente, a confiança ou desconfiança que o testador nutria por alguns em detrimento de outros). 
As disposições testamentárias revelam os bens materiais legados, com a nomeação do testamenteiro, herdeiros e respectiva herança. Possibilitam identificar a natureza e valor das legítimas, da “terça” do testador (a terça parte do património que por direito cabia ao testador que podia empregá-la como bem lhe aprouvesse, nomeadamente afectando-a a encargos pios por sua alma, ou legando parte dessa “terça” a quem entendesse). Os bens do testamento traduzem a disponibilidade financeira dos agregados domésticos. Além de referências ao património imóvel (nomeadamente o vinculado: morgadios e capelas), há toda uma série de bens móveis de grande interesse: desde logo o dinheiro, foros, títulos de propriedades, vestuário, jóias, utensilagem variada (doméstica, laboral, lúdica, etc…), armas, peças de arte, ou mobiliário. Bens que permitem aferir a composição e a avaliação das fortunas dos grupos sociais e, quiçá, quais as suas ligações com as esferas do poder.


José Vieira Gomes

Junho de 2010


QUADRO I
Exemplo de um processo de tomada de contas de testamento lançado na base de dados CALM.
Descrito por Elsa Gonçalves em 12.05.2010. Verificado por José Vieira Gomes em 17.05.2010.


Código de referência
 
PT-ARM-JRE/151-44
Titulo
 
Autos de contas do testamento de Teresa de Jesus, viúva de António Francisco Lucas
Data
 
1804
Nível de descrição
 
Documento Composto
Dimensão e suporte
 
1 cap.: 11 f. ms. num. e rub.
Âmbito e conteúdo
Testamento: datado de 1802-09-03.
Testamenteiro: José Gonçalves Teixeira.
Data de óbito: 1802-09-21.
Morada / Freguesia: morador na Lombada dos Esmeraldos, Ponta do Sol.
Pais: Francisco de Sousa e Filipa da Silva.
Propriedades: deixa à sobrinha Maria, filha do mestre Joaquim de França e de Maria de Sousa, 50.750, em benfeitorias que possui sobre térreo do morgado Agostinho José de Ornelas.
Móveis: uma caixa e uma cama que deixa à dita sobrinha.
Roupas de casa: à mesma sobrinha, deixa, quatro lençóis de pano de linho, dois de estopa, duas toalhas de prego, uma com renda, outra sem.
Cota original: mç. 151, n.º 12908.

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